Depois da maravilhosa aula teórica que nos deu na primeira parte do seu minicurso na Cave Legrand, em Paris, a sommelière brasileira Ana Carolina Dani propôs que fizéssemos a parte prática, a degustação, às cegas. Isso significava experimentar vinhos de regiões diversas com as garrafas cobertas, sem termos qualquer dica sobre eles. Topamos na hora.
Precisávamos utilizar algumas noções adquiridas para descobrir, pelo menos, se cada vinho era do Norte ou do Sul da França, de região quente ou fria e, se possível, de quais tipos de uvas era feito. E assim começamos a provar uma seleção de vinhos de pequenos produtores, uma espécie de “face secreta” dos vinhedos franceses.

Ana Carolina e uma garrafa coberta com a qual deu início à degustação na Cave Legrand: prova às cegas
Fomos arriscando, errando e acertando – e bebendo, é claro. Nessa empreitada, além de alguma memória visual, olfativa e gustativa com relação a algumas cepas de uvas, ajudou-nos bastante na descoberta das áreas de onde vinha cada rótulo a noção do clima de cada região. Isso porque áreas mais frias produzem vinhos mais leves e com maior acidez, enquanto nas mais quentes, pela maior incidência do sol, as uvas concentram mais açúcar (e, portanto, a bebida fica mais alcoólica), fazendo com que os vinhos sejam mais encorpados.
Brancos – Munidos de queijos, frios e pães para acompanhar, começamos pelos brancos. Acertamos, via olfato e paladar, o segundo deles (descrito mais abaixo). Mas, primeiro, provamos o “Les Chaillées de L’Enfer”, de Condrieu, “sub-região” do Rhône, que é uma das mais importantes regiões produtoras do país.
Da safra 2011, é um branco com mais corpo e que pede acompanhamento – definitivamente não serve como apenas um aperitivo. Gostamos bastante. Tem uma coloração dourada e, na boca, baixa acidez e sabores que lembram maçã madura e mel. Para resumir: diferente (do que estamos habituados), mas bem saboroso.
Em seguida, foi-nos servido nada menos do que um Borgonha, mais precisamente de Puligny-Montrachet, onde sabidamente são feitos alguns dos melhores vinhos brancos do mundo. Também da safra de 2011, esse “Les Perrières” era um premier cru, a segunda classificação mais nobre da Borgonha. Em relação ao primeiro, embora de coloração semelhante, era mais ácido, mais cítrico e muito mais frutado – um espetáculo.
O terceiro branco foi o Vasse (2013), classificado como “Vin de Pays”. Trata-se de uma categoria à qual pertencem vinhos franceses que não foram produzidos conforme as regulamentações de apelação de origem (AOC – Appellation D’Origine Contrôlée), mas que continuam a apresentar um forte caráter regional.
Engana-se, no entanto, quem pensa serem estes vinhos “inferiores”. Um “Vin de Pays” pode ser de alta qualidade, como é o caso desse aqui, do Domaine Pierre Vasse. Ana Carolina nos explicou que ele é considerado um dos grandes vinhos que têm sido feitos, nos últimos anos, por novas gerações de produtores que despontam no Sul da França.
Tintos – Passamos aos tintos em grande estilo: um Marsannay (Borgonha), “Les Congeroies” (2013). Talvez pela ainda recente viagem que fizemos à Borgonha, há um ano e meio, talvez apenas por serem os vinhos daquela região os nossos preferidos em se tratando de franceses, acertamos em cheio, mesmo às cegas.
Claro que não o nome ou a safra, nem a cidade (Marsannay). Mas, ao prová-lo, soubemos na hora estarmos diante de um pinot noir borgonhês, com a sutileza característica da uva pinot noir cultivada na Borgonha. Sem falar na cor, aquele rubi “claro” e delicado. Muito, muito bom.
Depois, foi a vez do “Ripa Sinistra” (2013), vinho mais encorpado da região do Rhône. Um bom tinto, feito basicamente com a uva syrah e de pequena produção (pouco mais de 3.000 garrafas por ano).
Quando acreditávamos que tinha acabado, eis que a Ana nos traz, para fechar os trabalhos, um baita vinho de Bordeaux. Inicialmente, ele nem estava previsto no programa, mas havia uma “sobra” de um curso anterior e fomos contemplados.
Era o “Château La Fleur” (2009 – foto acima). Traduzindo: um vinho de classificação grand cru da região de Saint-Émillion, uma das mais prestigiosas de Bordeaux. Corpo, aroma, sabor: tudo ótimo, sublime. Encerrávamos assim uma tarde maravilhosa de aprendizado, conversas e muito vinho em Paris.
2 Comentários
Muito legal o texto, Leticia e Eduardo. Adorei ! E obrigada por compartilhar aqui esse momento que foi tao especial para nos. Abs e santé. Ana.
Que bom que gostou, Ana! Para nós, foi uma experiência inesquecível nesse mágico caminho de descoberta do mundo do vinho. Obrigada! Santé!