A casa de número 1 da Place Charles de Gaulle, no vilarejo de Avize, região de Champagne-Ardenne, na França, não difere muito das construções vizinhas: bonita, florida, mas singela e sem qualquer ostentação. Quando achamos o endereço, sabíamos o que encontraríamos ali (champanhe!), mas não podíamos imaginar o aprendizado e o prazer que aquela degustação nos traria. Tudo graças à generosa e despretensiosa “aula” que nos foi dada por um verdadeiro artesão dessa bebida chamado Dominique Bouquin.

Na sala: durante a degustação, conversas sobre a cultura do champanhe e o trabalho no dia a dia de um pequeno produtor
Nada na casa, sede do Champagne Bouquin-Dupont Fils, remete à festa e ao glamour tão associados ao champanhe nos quatro cantos do mundo. A começar pela figura despojada e tímida de Bouquin, da terceira geração da família.
Tudo começou em 1929, quando Paul Emile Gaston Dupont comprou um vinhedo em Avize e, em 34, iniciou a produção. A partir do fim dos anos 60, a filha Lilianne Dupont e o marido dela, Michel Bouquin (pais de Dominique), assumiram o pequeno empreendimento.
Dominique nos recebeu na sala para a degustação gratuita que originalmente daria direito à prova de dois champanhes diferentes. E assim começamos uma conversa reveladora sobre a cultura do champanhe e da região, as diferenças entre as cidades, o trabalho no dia a dia de um vigneron…
Acabamos experimentando quatro rótulos e comprando duas garrafas. E ainda conhecemos todas as etapas da produção em si, ali mesmo, nos cômodos da casa.

Fachada da sede do Champagne Bouquin-Dupont Fils, em Avize, cidade da Côte des Blancs, na região de Champanhe
Depois de desfeita a impressão inicial de Dominique, de que éramos importadores, arranhamos o francês o máximo que deu – a única língua que ele fala – e fomos fazendo perguntas sobre a região, a história da bebida, as diferenças entre grandes e pequenos produtores etc. etc. Ele não fez questão de entrar em qualquer polêmica do tipo “qualidade versus quantidade”, mas a pergunta que nos fez durante o papo já dizia muita coisa:
– Como é que um rótulo de uma grande maison pode ter sempre o mesmo sabor se, ano após ano, as safras são tão diferentes?
É claro que não pode, foi o que concluímos (confirmando o que já sentíamos há algum tempo). A não ser com muita intervenção do enólogo para garantir aquela “marca”, aquele sabor que será sempre o mesmo não importa o “quando” nem o “onde” seja bebido. Refletimos que se trata – é óbvio! – de gosto, escolha, mas para nós ficou ainda mais claro que a elaboração artesanal é que faz a verdadeira riqueza dessa bebida tão especial.
Produção – A Bouquin-Dupont produz não mais do que 15 mil garrafas por ano. Tem no portfólio champanhes brut, demi-sec, extra brut e um rosé brut. Os preços variam de 16 a 36 euros a garrafa. As mais caras são as “safradas”, chamadas de millesime (quando o champanhe é feito com uvas de um ano apenas, o que ocorre quando a safra é considerada excepcionalmente boa, tudo de acordo com a legislação da região). Todos são envelhecidos de 3 a 10 anos na cave, seis metros debaixo da casa.

A cave de pedras que fica debaixo da casa: champanhes envelhecem de 3 a 10 anos antes de serem comercializados
As uvas vêm de um total de pouco mais de três hectares de vinhedos próprios localizados ali mesmo em Avize (a maior parte) e nas cidades vizinhas de Cramant, Oger e Mesnil-sur-Oger. Todas “grands crus”, a melhor classificação que existe em Champanhe. A plantação é só da uva branca chardonnay, com exceção de uma pequeníssima parcela da tinta pinot noir que compram de terceiros, apenas para a elaboração do rosé (92% chardonnay + 8% pinot).
Depois da degustação – um brut, um rosé, um brut “vieille reserve” (com mais tempo de amadurecimento que os demais) e um extra brut, todos ótimos para o nosso gosto –, Dominique nos convidou para conhecer a cave, onde o champanhe envelhece nas garrafas. Abriu uma porta de madeira que dá para um porão todo revestido de pedras onde a temperatura média fica em 10 graus o ano todo. E ficamos ali, ouvindo mais explicações em meio a milhares de garrafas de champanhe…

Cômodo nos fundos da casa onde Bouquin faz manualmente todo o trabalho final de etiquetar e encaixotar as garrafas
Em seguida, conduziu-nos a um cômodo nos fundos da casa, onde ficam as pequenas máquinas que ele utiliza, por exemplo, para colocar a rolha, o lacre, o rótulo e onde encaixota as garrafas – que exporta para Estados Unidos, Itália, Bélgica, Suécia, Alemanha e Dinamarca. Enquanto falava, etiquetava algumas garrafas na nossa frente. No fim da visita, perguntamos quantas pessoas trabalham ali com ele.
– Apenas eu – foi a resposta simples e direta daquele legítimo artesão do champanhe.
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