Em poucas vinícolas chilenas é possível sentir uma atmosfera tão histórica quanto na Casa Silva. O impacto se dá já na chegada à sede desse “império do vinho”, que hoje produz mais de 15 milhões de garrafas por ano – 90% para exportação, principalmente para Brasil e Estados Unidos. Depois de sair da rodovia e pegar uma estreita estrada secundária, na localidade de Angostura (no Vale do Colchagua), descortina-se, em distintos tons de verde, o imenso terreno da marca que mundo a fora é um dos sinônimos do vinho chileno.
Os 150 hectares de vinhedos desse local se somam a mais 850, plantados em outras quatro áreas: Los Lingues (no noroeste do Colchagua), Lolol (a 30 km do Pacífico, em linha reta), Paredones (na chamada Costa Fria do Colchagua) e Lago Ranco (lugar remoto entre duas montanhas perto da Cordilheira). Mas é nas vinhas de Angostura que a história pulsa mais forte: ali há plantas que datam de 1912, com cepas originais trazidas da França pela primeira geração da família.
Enquadram-se nesse caso as centenárias parreiras de sauvignon blanc e de sauvignon gris – redescoberta em 1998 e que atualmente faz da Casa Silva uma das poucas vinícolas do mundo a elaborar um vinho feito 100% com esta variedade. Chardonnay e merlot completam o time das cepas mais bem enraizadas nos solos de Angostura.
Visita – Ao contrário do que costuma acontecer em vinícolas muito grandes, na Casa Silva a visita não nos pareceu impessoal. O nosso grupo era pequeno e a guia foi bastante atenta e cuidadosa nas explicações. Ficou faltando um passeio por entre alguns vinhedos (como os das fotos acima), o que acabamos fazendo só depois, a caminho do restaurante.
Durante o tour, percorremos a linda sede da bodega em estilo colonial. Enquanto passávamos por áreas como as de prensagem das uvas, tanques de armazenamento (acima), salas de barricas (abaixo) e até pelo charmoso hotel-boutique da vinícola (foto do pátio, abaixo), fomos conhecendo a história da família Silva. A primeira geração saiu da região francesa de Saint Emilion, em Bordeaux, e chegou ao Chile em 1892, sendo pioneira no Vale do Colchagua.
Mas a Casa Silva tal como a conhecemos tem apenas 20 anos. Foi só em 1997 que o filho mais velho da quinta geração da família, Mario Pablo Silva, decide, com o pai, dar o nome da família à vinícola. Desde então, cresce o império com mais hectares de vinhedos, maior produção, mais rótulos, mais tecnologia, mais marketing e mais exportação – e alguns vinhos muito bons, é claro.
Degustação – Depois da visita, partimos para a degustação que havíamos reservado: uma prova de quatro vinhos totalmente ou em parte feitos com carmenere, a uva de origem francesa que é a cepa-ícone do Chile. No geral, gostamos bastante dos vinhos.
Mas a degustação em si foi um tanto “desleixada” por parte de quem a conduziu. Visivelmente com pressa e sem paciência, a vendedora da loja (foto acima), onde ocorreu a prova, deu curtas e mecânicas explicações sobre cada vinho e só – talvez a pior condução de uma degustação que já experimentamos até hoje. Paciência…
Começamos com o Doña Dominga Reserva 2015 (carmenere). Bem frutado, mesmo tendo passado por madeira durante oito meses, o vinho é gostoso e fácil de beber. Em seguida, foi a vez do Casa Silva Gran Terroir de Los Andes 2015 (carmenere). Com mais tempo de barrica e mais estruturado, ainda assim o achamos um tanto “alcoólico demais” (no sentido de predominância do álcool sobre a fruta).
Depois, passamos ao Quinta Generación 2012 (um blend, uma combinação de tipos de uvas, estando a carmenere entre elas). Muito bom, “mais forte”, deve ir bem com carnes vermelhas gordurosas, além de massas com molhos intensos. Para fechar, o Altura 2008 (também um assemblage com 40% de carmenere, 30% de cabernet sauvignon, 15% de syrah e 15% de petit verdot). Um vinho intenso, gostoso e no qual os 14,5% de graduação alcoólica estão bem equilibrados e quase não se fazem sentir. Ótimo, ainda mais se harmonizado com carne de porco, cordeiro ou carnes de caça, por exemplo.
Almoço – Por falar em carne, dali seguimos para a última etapa da visita, um almoço no aclamado restaurante da vinícola (acima). O lugar é lindo: em frente à varanda da casa com cara de sede de fazenda, um jardim perfeitamente aparado com vista para a Cordilheira dos Andes; nos fundos, o histórico campo de pólo da família, no qual torneios são disputados durante o ano.
A expectativa era alta, mas infelizmente a realidade do almoço em si não correspondeu. Não foi ruim. Mas ficou muito aquém do desejado. A começar porque os garçons nem sabiam da nossa reserva.
Tínhamos escolhido semanas antes o menu harmonizado com vinhos da casa, mas eles pensavam que escolheríamos à la carte. Além disso, a pouca opção de vinhos em taça para acompanhar o menu – num dos restaurantes mais badalados em se tratando das vinícolas chilenas – foi algo que nos desapontou.
De entrada, ambos pedimos ceviche de atum acompanhado de uma taça de espumante Dominga Brut (acima). Como prato principal (abaixo), cada um de nós escolheu uma das opções disponíveis: medalhão de filé (250g) feito na brasa com uma espécie de purê de milho (que estava muito doce); e ravioles recheados com carne de caranguejo e manteiga de sálvia. Comida correta e ponto.
Um detalhe importante é que havia apenas duas opções de vinhos em taça incluídos no menu, cabernet sauvignon (que pedimos para a carne) e carmenere (para a massa). Como se isso não bastasse a escassez de oferta, as taças foram trazidas à mesa já servidas, sem que pudéssemos ver as garrafas, os rótulos, entender melhor que gama de vinhos eram etc.
Decepcionante. Como foi também a sobremesa, um nada inspirado profiterole recheado com sorvete de baunilha e acompanhado de doce de leite – sem vinho de sobremesa para acompanhar e com a sensação de que a Casa Silva precisa melhorar a experiência que oferece aos seus clientes, como nós, apaixonados pelo universo do vinho.
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